Já perdi as contas de quantas vezes estive em alguma barranca desse gigante São Francisco. Também não é coisa para ficar guardando de cabeça, assim como não lembramos quantos amores tivemos, sorrisos demos, alegrias sentimos. Coisa boa não é para anotar em caderno. É para viver!
Desta vez, será com responsabilidade redobrada que pisarei o chão lambido pelas águas do Velho Chico. Farei o melhor para contribuir de alguma forma com a gente batalhadora deste rio. Passei anos escutando suas histórias, experiências e sabedorias. Agora chegou a vez de retribuir e tentar documentar o máximo que conseguir essa cultura oral tão importante para o nosso país.
Nunca conheci a Europa, nunca fiz compras em Nova York e somente uma vez – nestes 33 anos de sobrevida nessa terra – coloquei meus pés no exterior. Fico triste, pois queria conhecer outras culturas, outros povos, tudo! Mas me orgulho, pois optei por gastar o meu tempo tentando conhecer a fundo o interior do meu país.
Nenhum brasileiro precisa amar o Brasil, mas todos têm a obrigação de conhecê-lo, mesmo que seja para odiá-lo.
Acho que é isso que pensarei a cada dia dessa empreitada que se inicia por Petrolina, no meu amado Pernambuco.
Sigo em busca de histórias, de lendas, de batalhas de vida, de música, de versos. Talvez o verso seja a marca desse rio, onde, na submersa cidade de Remanso, até as mensagens das lápides eram escritas em versos.
Levarei a saudade das minhas duas meninas loiras. Por elas, sonho.
Arrêa!
Gustavo Nolasco
É difícil explicar as sensações, tão intensas, na véspera de uma viagem tão incrível. Afora as inúmeras atividades de pré-produção, pesa a responsabilidade da tarefa. Trata-se de conhecer, documentar e desvendar as pessoas que moram às margens de um rio, cuja história está ligada à ocupação do país. Local que, antes da chegada dos europeus e africanos, alimentou com fartura diversas tribos indígenas ao longo de seu extenso trajeto. Rio que durante anos foi a ligação entre os dois extremos do Brasil.
Já conheço alguns trechos mineiros do Velho Chico. Sua belíssima nascente, a região de Três Marias e, por diversas vezes, estive em Pirapora. No ano passado, tive o privilégio de navegar desta cidade até Januária, ao longo de cinco inesquecíveis dias. E o pouco que conheço desse rio, já é suficiente para me apaixonar.
Agora vou rumo ao desconhecido. Região que nunca pisei, no coração do sertão. Local onde caminharam gigantes, como Antônio Conselheiro e Lampião. Irei até o extremo desse caminho, onde o Bispo Sardinha foi devorado, símbolo de ideias importantes que andam esquecidas.
Sei que vou encontrar motivos para, mais uma vez, me indignar com a burrice imensa que é a relação atual da humanidade com as águas, maior fonte de vida do mundo. Modo de vida suicida, que acha que vale a pena destruir um rio para produzir bugigangas inúteis.
Mas também vou conhecer aquela boa gente do Nordeste, resquícios de gerações que viveram ao lado do rio, pelo rio e em função do rio. Rio que nesse trajeto proporciona paisagens tão incríveis, que, segundo dizem, são das mais belas do nosso país.
Como toda viagem longa, o cansaço e a saudade das pessoas queridas serão um problema. Mas pode haver coisa melhor do que viajar fotografando e conhecendo pessoas, lugares e sensações novas?
Povo do Opara, Velho Chico, Rio São Francisco. É com muita reverência que inicio essa jornada.
Leo Drumond